2005-06-30

 

O RETRATO DE UMA SOCIEDADE

Leio no Diário de Noticias esta pérola. Fico a saber que uma formação partidária denominada PPM ainda existe. Sou informado que este mesmo partido terá escolhido como candidata para a Câmara Municipal de Cascais uma senhora conhecida por ter participado no edificante programa televisivo “Quinta das Celebridades”. A excelente ideia foi defendida pelo senhor Gonçalo da Câmara Pereira, líder da distrital de Lisboa do PPM. O DN informa que estas duas criaturas partilham alguns predicados, entre eles a excitante participação no já citado êxito televisivo.
Justificando a candidatura, o senhor Pereira é particularmente eloquente: "Convivi com a rapariga todos os dias durante mês e meio. Embora ela tenha saído da Quinta com uma depressão, se me dizem que ela está curada, está curada. Também já houve ministros ex-toxicodependentes e não veio daí mal ao País". Entende ainda que a candidata "É uma mulher independente, que não precisa de macho, que se preocupa muito com as questões sociais e que é uma visitadora nata."
Podemos rir, podemos convocar este exemplo para um serão de galhofa, poderemos até concluir com um desabafo, a verdade é que nada disto surpreende quem observe a sociedade portuguesa. Quem leia os resultados das sondagens que atribuem a vitória ao senhor Torres em Amarante e à senhora D. Fátima em Felgueiras, quem se recorde da facilidade com que se transformou um apresentador de TV em grande empresário, quem perca algum tempo observando os programas televisivos com maior audiência, quem olhe em redor na banca das revistas, percebe que falamos de episódios diferentes da mesma triste telenovela de vacuidade e miséria intelectual em que mergulhamos inexoravelmente.
Numa sociedade em que se promove o culto do efémero, em que se desenvolvem "culturas" poderosas em torno de objectivos tão desesperadamente perseguidos como “aparecer”, ou “ser conhecido”, nada disto poderá constituir novidade. O grotesco e a bestialidade de tão utilizados e mediatizados são hoje mais do que aceitáveis, quase inevitáveis.
Os partidos políticos julgaram ver aqui um filão a explorar, constituindo-se progressivamente como elementos desta doentia corrente. Assim, e para além dos supra-citados exemplos, o PSD ensaia com as candidaturas de um fadista à Câmara de Vila Viçosa, ou de um treinador de futebol à Câmara de Palmela, o caminho que ganhará progressivamente destaque. Não é sequer um comportamento exclusivo do PSD ou do PP, mas infelizmente generalizado. Os partidos políticos seguem, desta forma, uma estrada sem retorno. Incentivados por populistas acéfalos e tecnocratas marketeiros que reclamam “segmentos de mercado” ou “janelas de oportunidade”, trilham alegremente, a rota da sua negação, da sua desgraça.
Nada disto justifica uma anedota, uma risada. Tudo isto não é mais do que o agoniado retrato de uma sociedade pobre, videirinha, estéril.

Comentários:
Isto é uma comédia de pendor trágico.
 
Hoje é um dia de sentimentos opostos. Ao ler este post fiquei sem saber se ria ou se chorava!

Há muitos anos que não temos partidos interessados em levar o país em frente! Há muitos anos que se assiste a uma corrida desenfreada pelo poder! Se fôr preciso, fica-se em cima do muro!No fundo,o objectivo primeiro é O PODER.

Se tal não fosse poderiamos assistir a oposições "produtivas" e não simplesmente destrutivas da credibilidade da imagem governamental. Oposições que fizessem frente, que tivessem propostas, que fizessem críticas construtivas. (não era em frente que queríamos andar?)
Não falo do actual ou de anteriores governos em particular. Falo dos poucos anos em que assisto ao "show biz" dos políticos e como muitos jovens da minha geração me vou desmotivando e afastando da política.

O que fica é:
Pena que a nossa política seja feita destes políticos.
 
Grau zero da política, isto para não dizer que chegou abaixo de zero.
Isto é a completa mistura entre espectáculo e política, o que convenhamos, não augura nada de bom.
 
Por estas e por outras do mesmo calibre, é que muito boa gente prefere gastar um bom pedaço do seu tempo pela blogosfera a ler e a escrever sobre política, do que tentar passar das palavras aos actos, para ajudar o país. Corria o risco de ter de ombrear com criaturas do calibre supracitado, o que seria confrangedor.
 
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