2004-11-18

 

UMA SOCIEDADE MAIS POBRE

Foi recentemente publicado um livro muito interessante de Joaquim Veiguinha (O Luxo na Formação do Capitalismo) que merece uma leitura atenta.
No segundo capítulo o autor centra-se na reacção da alta nobreza francesa ao crescente enriquecimento da burguesia no período anterior a 1789 que “ameaçava minar as tradicionais distinções de nascimento” na opinião do duque de Saint-Simon. O mesmo que escreveu nas suas memórias (1739-1749) a propósito da difusão do luxo “é um cancro que alimentado pela confusão das condições sociais, pelo orgulho e pelas próprias conveniências, que pela maioria está sempre a aumentar, e as consequências de tudo isto são infinitas e conduzem indubitavelmente à ruína e a transformações gerais”. A alteração do rígido sistema que Saint-Simon entendia como perfeito (para ele e seus pares) seria uma obra do Demo. Pouco importa o que motivou estas palavras, se o luxo ou outra manifestação. Há aqui a base do conservadorismo de direita: a rigidez social. A crença na definição rigorosa de Classe / Casta emanada de Deus e como tal imutável. Nem o facto de hoje encontrarmos este pensamento disfarçado de palavras mais doces altera o essencial.
Encontramos a sua expressão, por exemplo, aquando da eleição de Cavaco Silva. Goste-se, ou não do antigo Primeiro-ministro, o certo é que este trouxe para a primeira linha da política nacional de então indivíduos de origens mais humildes. Foi um choque para aqueles que se julgavam (julgam) predestinados para os mais altos cargos, “próceros de nascença”. O jornal “O Independente” surge com o inegável objectivo de ridicularizar os novos governantes “sem berço”. Desde a campanha contra a”peúga branca” até a citação do famoso telefonema de Dias Loureiro “pai, já sou ministro”, passando pela torpe perseguição a Macário Correia, valeu de tudo na tentativa de mostrar que a ausência de “berço” era inaceitável. Para a direita de hoje, a campanha é a mesma, mas a subtileza é maior. A ironia é que procura atingir estes objectivos com uma cortina da “protecção aos mais desfavorecidos”. Na tentativa de ultrapassar a esquerda utilizam-se as suas “bandeiras” para disfarçar o seu verdadeiro objectivo: defender os interesses, os privilégios, a rigidez social. Essencialmente a defesa de uma sociedade mais pobre!

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