2005-01-16

 

MARKETING POLÍTICO (V)

Encerrando esta primeira fase de observação, proponho uma reflexão sobre dois elementos importantes em qualquer partido: as “jotas”, e as “bases”.

As juventudes partidárias, ou “jotas” como gostam de chamar (talvez apelando a uma “suavização do termo) são constituídas por jovens com envelhecimento precoce. Procuram na aprendizagem rápida da cantilena dos “seniores” o passaporte para a credibilidade, começando por se colocar em bicos dos pés, repetindo, com mais veemência, as frases ocas dos maduros. Inevitavelmente, este comportamento garantir-lhes-ão “dar nas vistas” e será valorizado, percebendo-se que compreendem e aceitam os códigos tácitos de linguagem e comportamento do partido.
Os “jotas” fazem assim o seu percurso, precocemente desligados de tudo o que o rodeia, concentrados que estão na sua “carreira”. Fazem a sua aprendizagem observando e participando nos “jogos” de poder internos, deleitando-se com a perspectiva de ter um papel em tão dignificantes construções de cenários e pequenas traições que os fazem sentir ter encontrado ali “o seu lugar”. Vão ganhando um destaque no convívio com os colegas e inserem-se diligentemente no partido. Constituem um triste “partido dos pequeninos” em que só a ignorância e o vazio de ideias são “em grande”. Em períodos de campanha tornam-se o filão onde se buscam as caras jovens devidamente vestidas com a t-shirt do partido que asseguram uma “energia” e um visual “jovem” sempre atraente. A sua dedicação e vontade garantem braços sempre disponíveis para o trabalho de rua.
Durante a campanha, na fase mais agerrida, é reservada aos “jotas” a tarefa de criticarem de forma mais rude o adversário, fazendo-o com a “irreverência” que sabemos “própria da juventude”. Os jotas, agarram com tal entusiamo a tarefa que, invariavelmente, tropeçam na sua impreparação e na vontade de agradar, causando muitas vezes embaraços aos mais afoitos.
Oferecem ao grande líder a possibilidade de os apresentar (irradiando felicidade) como o futuro do partido, garante de uma ligação às novas gerações com a sua conhecida “irreverência”, a mesma que os faz usar “pull-over” e “jeans” nos primeiros dias como deputado exibindo, com orgulho, o sinal da sua enorme “capacidade de protesto”.

As bases são a eterna referência em qualquer partido. Em seu nome pretende-se uma ligação ao país profundo. Qualquer estratégia de poder no partido não pode dispensar o apoio dos líderes das concelhias, são estes que controlam o seu pequeno feudo, e logo constituem, eles próprios, as “bases”. Os “generais” do partido acompanham e apoiam os seus apaniguados para garantir o controlo do maior número de concelhias, forma maior de “ter o partido na mão”. A manutenção destas fidelidades implica uma desgastante dedicação, com presença nos “eventos” organizados pela concelhia, nas incontornáveis festas de verão, e num ou noutro casamento ou baptizado, cuja presença possa “honrar” o colega presidente da concelhia provando-o próximo dos “grandes” nomes do partido . São gestos que não se esquecem, e se pagam com a dedicação dos “delegados” num próximo Congresso, que o “general” saberá negociar com mestria.
As “bases” personificadas nos presidentes das concelhias irão, por seu turno, aproveitar o seu apoio, usufruindo desta ligação directa e do acesso privilegiado (possuindo o número privado de telemóvel do “general” que, de resto, exibem amiúde com inusitado orgulho, prova de uma cumplicidade e proximidade com o poder).
O poder dos líderes das concelhias não é despiciendo, têm uma palavra a dizer na escolha dos candidatos autarquicos, na constituição das listas mas, sobretudo, distribuem os cargos locais de nomeação pelos seus apoiantes, que aumentam caso o partido tenha a felicidade de ganhar as eleições. São poucas dezenas, e servirão para as gradiloquentes afirmações sobre as “bases”.

Nos partidos políticos a política está a esvaziar-se. Discutem-se lugares, tricas, tácticas. Não se discutem opções políticas, ideológicas, não se discute uma visão da sociedade. Quando necessitam de apresentar os projectos e programas de governo, invariavelmente, os partidos necessitam de encenar uma “abertura à sociedade civil” em jeito de jornadas para ouvir opiniões e opções, as mesmas que raramente discutem internamente.
O Marketing político perde-se na construção das mensagens que concentram no inimigo externo o foco de atenções, procurando encontar uma forma de união do partido, já que a matriz ideológica deixou, há muito, de ser o elo comum entre os seus elementos.
O Marketing político deu corpo a este esvaziamento, centrando-se na iconografia e na adaptação do discurso “aos tempos modernos” (leia-se televisão), uniformizou os comportamentos e “tiques”, esvaziou a componente ideológica reforçou o espectáculo.
A política surge assim como filha enjeitada. Haja quem lhe dê guarida e a atenção que merece - Como? Eis a dúvida para debate.

Comentários:
Nem me fales em Jotas(em todos eles...)
Enervam-me!
 
Luís, aí está uma grande pergunta - Como?
Sinceramente, não sei.
Já vimos que o estado a que chegámos só foi possível, porque as organizações o permitiram e que é essa permissão, esse deixa-andar, que torna aliciantes os lugares/cargos. Só se passarmos a estar atentos a todas as vilanias e as denunciarmos, persistentemente, por forma a que quem as cometa se sinta sob vigilância e se modere ou, até, desista do lugar que ocupa.
Então, serão os cidadãos a obrigar as organizações a ponderar, antes de nomearem criaturas que à primeira oportunidade dêem azo a escândalo.
Assim, neste momento, apenas me sinto capaz de sugerir atenção, muita atenção.
Será uma 'limpeza' demoradam, mas talvez
 
Ops!... 'cliquei' onde não devia.
Dizia eu, que será uma 'limpeza' demorada, mas talvez seja a única que está na nossa mão.
 
E, feita malcriada, saí sem me identificar...
Sou a signatária deste comentário e dos dois anteriores.
DespenteadaMental (como acabei de provar)
 
Aí está a grande questão!
Como sair disto? Que fazer para quebrar esta engrenagem que tão bem retratou neste seu excelente trabalho?
Como em tudo na vida, se não há (a) solução há sempre várias soluções. Vamos excluir, por razões óbvias, as medidas radicais. Então, restam-nos acções que caem na nossa área de intervenção, e aí é a denúncia constante, incisiva, persistente...Há que vencer o desânimo e bater sempre e cada vez mais forte.Sem nos apercebermos, iremos crescendo e seremos fortes.
Não estou a ser sonhador! Não ignora por certo, a enorme influência da música de Zeca Afonso e de Adriano Correia de Oliveira no detonar do 25 de Abril !!!
A outra medida ao nosso alcance, vou guardá-la para mais tarde.
 
De forma suscinta, o meu comentário a este teu excelente post: quando jovem ingéuo, pertenci a uma (jota), conheci muito, e bem, os meandros... fui à procura de ideias, encontrei pequenos burgessos a treinar facadas. Sai da dita jota quando, num congresso, defendi a extinção da mesma, não fazia sentido... aquilo era demasiado mau... nunca vi uma ideia a ser discutida, mas vi-me em muitas discussões de lugares na fila para comer da gamela. Não tinha paciência para aquilo.
Aprendi que nas jotas encontramos muitos jotihas a querer não pertencer às bases... se é que me faço cmpreender.
 
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