2005-09-19

 

ESTÓRIAS ÍNFIMAS (III)

Estavam todos sentados na grande sala, aguardando o momento da chamada. Cumprirão, com profissionalismo, um esgotante horário de trabalho, reagindo com precisão às alarvidades do apresentador televisivo, respeitando as indicação das placas exibidas pelo assistente de realização.
Representam a versão revista e modificada das carpideiras. Tem graça que fale nas carpideiras, nunca me pediram para chorar, diz um dos profissionais das plateias, aqui mesmo ao lado, passeando a mãozinha pelo queixo como se convocando memórias outras, procurando talvez a confirmação da sua estranheza, interrompe-o um colega que lhe relata a sua experiência, num “programa dos velhos tempos” quando se juntavam pais, tios, avós e primos perdidos e achados, emoção a rodos, o que eu para ali chorava, valha-me Deus! Tomava a palavra o outro, que se gaba ser actor, pois que tinha representado “com muita convicção” o papel do malandro vigarista lá naquele programa da televisão, pá como se chamava aquilo, tu queres ver que me esqueci? Que se lixe, aquilo foi tão bem feito que a malta conhecida pensava que era verdade, imaginem lá os outros... uma coisinha do outro mundo!
Segue aquela senhora que nos arrasta para os directos na televisão a preto e branco, inundando a sala com a projecção de nomes de artistas vindos lá do baú onde os tinha guardados. Abria, à nossa frente, uma caixa de Pandora da memória. Assim, de repente, entravam pela sala toda a espécie de cantores presos a microfones, enleados em fios intermináveis, ameaçando o equilíbrio dos mágicos que traziam cartolas, coelhos e assistentes com ousadas farpelas, deixando perceber um ou outro tornozelo. Na confusão ouvia-se o tilintar dos grossos fios de prata dos cavalheiros, coisa que divertia muito o Topo Gigio, já entradote, queixando-se do reumático. Alguém que gritava lá fora, deixem entrar o trio Odemira, outros que se revoltavam, não dá, o tipo do restaurador Olex não se decide, diz-lhe para afastar a Famel e empurra aí o gajo da pasta medicinal Couto. Atenção, que vem aí o Luís Pereira de Sousa com o Júlio Isidro, anunciava em pânico o que se sentava junto à porta.
Armava-se já um burburinho de meter respeito.
Fechem-me essa caixa rapidamente, ordenava o contínuo no meio da confusão.
Toca a mexer, que o espectáculo vai começar!

Comentários:
Palavras para quê? São mais uns artistas portugueses que... nos querem enfiar o barrete!
 
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